Hoje deixo o beijo pendurado
no cabide da manhã,
para que lentamente
o possas vestir.
sexta-feira, 31 de agosto de 2007
quinta-feira, 30 de agosto de 2007
Os dias...
Os dias...
as manhãs a espreguiçarem-se
no esboço dos rostos.
as horas...
espreguiçadas no rosto
do esboço das manhãs.
as manhãs a espreguiçarem-se
no esboço dos rostos.
as horas...
espreguiçadas no rosto
do esboço das manhãs.
quarta-feira, 29 de agosto de 2007
Fora do Mundo Urbano
Desarrumar-te os livros.
Queria ter o poder de um sopro para que pelo menos o volume de cima ficasse desalinhado.
Nem na casa que se chegou a partilhar se admitia um milímetro de confusão. Eu tinha a mania da organização interna - alfabética, temática - tu, da harmonia externa: as lombadas tinham que compor uma sequência cromática, o caos uma aparência de serenidade.
...a casa... a casa branca, rematada a tons pastel.
No interior das janelas, bancos de pedra através dos quais se podia ficar a olhar para o mar dias inteiros.
Desesperavas com a humidade, o cheiro a fechado na roupa, as manchas salinas nas paredes, a humidade nos sapatos... Eu gostava de vestir a roupa assim, com um toque mesclado e um odor a velho, sentia-me em paz. Fora do mundo urbano, fora da cidade, deixada para trás.
As cidades, sinto-as febris como adolescentes, dançado sobre as pistas da sua própria luz, consumidas por uma inquietação difusa, cruéis, livres, impuras, amantes absolutas do novo, com toda uma sujidade inaugural. Sítios de queda e construção, leviandade e levitação, onde os acontecimentos se precipitam em cadeia e a verdade pequena de cada um existe verdadeiramente, alterando a composição química do todo a cada passo.
As cidades, sinto-as, febris. Onde falta o silêncio. Onde não consigo dormir em paz, desistir desse turbilhão urbano que tem a marca da minha respiração ofegante.
terça-feira, 28 de agosto de 2007
Matéria do Gostar
Não importa o que se gosta.
Importa a matéria desse gostar. As sucessivas camadas de vida que se atiram para dentro desse gostar.
As palavras são só um princípio - nem sequer o pincípio.
No gostar os princípios, os meios, os fins, são apenas fragmentos de uma história que continua para lá dela, antes e depois da ansia breve de uma vida.
Tudo serve a essa obsessão de verdade a que chamamos Gostar.
O escuro, a luz, o áspero, o macio, a falha, a persistência.
Importa a matéria desse gostar. As sucessivas camadas de vida que se atiram para dentro desse gostar.
As palavras são só um princípio - nem sequer o pincípio.
No gostar os princípios, os meios, os fins, são apenas fragmentos de uma história que continua para lá dela, antes e depois da ansia breve de uma vida.
Tudo serve a essa obsessão de verdade a que chamamos Gostar.
O escuro, a luz, o áspero, o macio, a falha, a persistência.
segunda-feira, 27 de agosto de 2007
Transfiguração
Já não preciso de contar histórias.
Deixo cair todos os efeitos lustrosos e atinjo o próprio "gostar", essa tinta espessa que flutua sobre o tempo e transfigura tudo aquilo em que toca.
Pode ser uma palavra amachucada, uma flor que envelhece, um búzio onde ainda cintila o mar onde já não vive.
Pode ser o teu rosto de ontem,
ou aquele que resta para hoje.
Deixo cair todos os efeitos lustrosos e atinjo o próprio "gostar", essa tinta espessa que flutua sobre o tempo e transfigura tudo aquilo em que toca.
Pode ser uma palavra amachucada, uma flor que envelhece, um búzio onde ainda cintila o mar onde já não vive.
Pode ser o teu rosto de ontem,
ou aquele que resta para hoje.
sábado, 25 de agosto de 2007
Omissão
Ninguém é capaz de descrever a curva dos teus dedos,
duendes em movimento de marioneta.
Ficava a olhar para eles, ansiosos por saltar sobre as tuas palavras, para que elas dançassem, corpos transparentes inebriados de sonhos.
Essas mãos omitidas aplanavam-te o discurso,
mas creio que nunca tive tempo de to dizer.
duendes em movimento de marioneta.
Ficava a olhar para eles, ansiosos por saltar sobre as tuas palavras, para que elas dançassem, corpos transparentes inebriados de sonhos.
Essas mãos omitidas aplanavam-te o discurso,
mas creio que nunca tive tempo de to dizer.
sexta-feira, 24 de agosto de 2007
Livros
...Apaixonei-me desde sempre por livros - pelo odor que neles nos invade, quando os abrimos; pela noite que neles nos resiste, depois de lidos, relidos e fechados. Pela vertigem que prossegue, incansável, entre as palavras sem dono, escritas da ausência para a ausência.
...afogo-me nos livros.
Livros radiantes onde outros tinham escrito sonhos, pesadelos, inquietações. Sublinho-lhes as poucas frases que tinham ficado por sublinhar, mas nenhuma me consola. Devo-te várias vidas, as vidas múltiplas que vêm nos livros, a minha vida em rede, mapa de atalhos nervosos que através dos livros ganhou sentido.
Devo a algo ou alguém ou até mesmo a mim, o conhecimento da dança, a ilusão do desejo nos olhos.
...afogo-me nos livros.
Livros radiantes onde outros tinham escrito sonhos, pesadelos, inquietações. Sublinho-lhes as poucas frases que tinham ficado por sublinhar, mas nenhuma me consola. Devo-te várias vidas, as vidas múltiplas que vêm nos livros, a minha vida em rede, mapa de atalhos nervosos que através dos livros ganhou sentido.
Devo a algo ou alguém ou até mesmo a mim, o conhecimento da dança, a ilusão do desejo nos olhos.
Cheiro a juventude
...porque por vezes a infância retorna à lembrança; porque por vezes os dias relembram os tons juvenis... reponho as palavras de Alguém, lidas, e que poderiam descrever a imagem de um qualquer fim de livro, ou de um qualquer retrato de recomeço...
..."E de súbito voltaste. Corres como se voasses - com essa leveza furiosa que só a adolescência conhece. A fita vermelha dança-te sobre o cabelo em desordem. Trazes uma braçada de livros bambos a escorregar-te das mãos e as tuas sapatilhas brancas mal pousam no chão. Há uma névoa de calor pesando sobre as coisas, mas o teu sorriso entra por dentro dela, estilhaça-a, arrasta o azul do céu através das ruas da cidade. Os teus livros desmoronam-se no meio da estrada, ajoelhas-te para os apanhar mas não paras de sorrir.
És tu, sim. O teu sorriso avançando, estático, sobre o meu rosto. És tu antes do tu que te conheci.
Ajoelhada no meio da estrada sacodes tranquilamente cada livro. Algumas páginas desprendem-se e voam. Voas atrás delas sem perderes o fio do sorriso.
Vejo-te lá em baixo, correndo agora através do jardim, a fita vermelha do teu cabelo iluminando o relvado verde. Haverá um cheiro a juventude perdida nesse relvado, há sempre um cheiro que se descobre depois na relva molhada. Mas já não me lembro como era, fica longe, longe, cada vez mais longe."
...porque o Verão tem este dom... o de trazer os cheiros que já nos pertenceram.
Ericeira, Agosto 07
..."E de súbito voltaste. Corres como se voasses - com essa leveza furiosa que só a adolescência conhece. A fita vermelha dança-te sobre o cabelo em desordem. Trazes uma braçada de livros bambos a escorregar-te das mãos e as tuas sapatilhas brancas mal pousam no chão. Há uma névoa de calor pesando sobre as coisas, mas o teu sorriso entra por dentro dela, estilhaça-a, arrasta o azul do céu através das ruas da cidade. Os teus livros desmoronam-se no meio da estrada, ajoelhas-te para os apanhar mas não paras de sorrir.
És tu, sim. O teu sorriso avançando, estático, sobre o meu rosto. És tu antes do tu que te conheci.
Ajoelhada no meio da estrada sacodes tranquilamente cada livro. Algumas páginas desprendem-se e voam. Voas atrás delas sem perderes o fio do sorriso.
Vejo-te lá em baixo, correndo agora através do jardim, a fita vermelha do teu cabelo iluminando o relvado verde. Haverá um cheiro a juventude perdida nesse relvado, há sempre um cheiro que se descobre depois na relva molhada. Mas já não me lembro como era, fica longe, longe, cada vez mais longe."
...porque o Verão tem este dom... o de trazer os cheiros que já nos pertenceram.
Ericeira, Agosto 07
domingo, 12 de agosto de 2007
sábado, 11 de agosto de 2007
Em memória a um "anjo" do IPO
APETECIA-LHE VOAR.
Apetecia-lhe tanto agarrar o sol, apetecia-lhe ser ave.
poder enfrentar o escuro de olhos abertos
e porque não, cortar o céu com o seu corpo leve da infância...
queria saltar os muros altos sem medo de aterrar cansada,
queria falar sorrindo e calar sempre que consentisse.
Sem sim, sem não, só com a voz dos olhos, queria voar.
Foi buscar as asas ao armário, limpou-as,
deu-lhes lustre com a força de outros tempos e saiu para a montanha
na esperança de ser cativada por um anjo azul.
Face ao inesperado foi pássaro,
e com as suas asas voou sem o medo de não encontrar o caminho de volta.
Disse, sorriso aberto, enquanto voava:
na vida não existe volta, só ida
e se tivesse percebido mais cedo,
já tinha voado antes.
Um beijo... a todos estes "anjos"... que "andam" por aí.
Síntese
Às vezes parece que vivemos mais depressa do que pensamos
e quando pensamos já não sabemos o que se passa.
Neste momento já não sei se escrevo
ou se foi um mar de pensamentos que me assaltou as palavras.
Apetece-me escrever.
escrever sem pensar nisso.
como se falasse, contrariando as barreiras do lógico.
Só para ouvir alguém ouvir
só para ouvir alguém responder.
e quando pensamos já não sabemos o que se passa.
Neste momento já não sei se escrevo
ou se foi um mar de pensamentos que me assaltou as palavras.
Apetece-me escrever.
escrever sem pensar nisso.
como se falasse, contrariando as barreiras do lógico.
Só para ouvir alguém ouvir
só para ouvir alguém responder.
sexta-feira, 10 de agosto de 2007
Os instantes
Os instantes têm a cor das manhãs
têm a suavidade dos dias
a urgência das horas
...têm também o sabor dos momentos
em que não sei se estás
se ficas
ou se já foste
têm a suavidade dos dias
a urgência das horas
...têm também o sabor dos momentos
em que não sei se estás
se ficas
ou se já foste
Telas matinais
quinta-feira, 9 de agosto de 2007
Folha em branco
"The pages are still blank,
but there is a miraculous feeling of the words being there,
written in invisible ink
and clamoring to become visible"
(Nabokov)
but there is a miraculous feeling of the words being there,
written in invisible ink
and clamoring to become visible"
(Nabokov)
Em memória a...
Deito a manhã no olhar e espreguiço as palavras deitadas no lençol da noite espessa.
Os gestos, para onde vão os gestos?
As texturas, para onde se refugiam quando deixam de ser parte do corpo?
O sentir, como esquecer o que não se quis lembrar?
A seda, a seda do tacto que desliza na ponta dos dedos...
o momento, o momento onde não se disse,
asolutamente nada.
Os gestos, para onde vão os gestos?
As texturas, para onde se refugiam quando deixam de ser parte do corpo?
O sentir, como esquecer o que não se quis lembrar?
A seda, a seda do tacto que desliza na ponta dos dedos...
o momento, o momento onde não se disse,
asolutamente nada.
quarta-feira, 8 de agosto de 2007
Já com saudades do Butoh...
Sempre que inicío o Butoh, vejo-me perante a hesitação por não saber por onde começar.
O Butoh não teria consciência própria se o separássemos do acto de viver... e deparo-me sempre com a questão: por onde começar?
Concluo que é no processo de hesitação que está o seu real começar - Inicia-se nos movimentos quotidianos do corpo.
Os ferimentos que recebemos no próprio corpo, cicatrizam e curam-se com o tempo; os ferimentos que recebemos no nosso interior, se aceites e contemporizados, farão nascer ao longo dos anos e das esxperiências, alegrias ou tristeza, que um dia nos conduzirão para um mundo de palavras, ou para a ausência delas.
Creio que é isso o Butoh, um mundo de poesia,
impossível de descrever por palavras,
só por meio do nosso próprio corpo.
Por tudo isso... dançem! com os dias.
O Butoh não teria consciência própria se o separássemos do acto de viver... e deparo-me sempre com a questão: por onde começar?
Concluo que é no processo de hesitação que está o seu real começar - Inicia-se nos movimentos quotidianos do corpo.
Os ferimentos que recebemos no próprio corpo, cicatrizam e curam-se com o tempo; os ferimentos que recebemos no nosso interior, se aceites e contemporizados, farão nascer ao longo dos anos e das esxperiências, alegrias ou tristeza, que um dia nos conduzirão para um mundo de palavras, ou para a ausência delas.
Creio que é isso o Butoh, um mundo de poesia,
impossível de descrever por palavras,
só por meio do nosso próprio corpo.
Por tudo isso... dançem! com os dias.
terça-feira, 7 de agosto de 2007
A Cidade com outros olhos
Procuro uma imagem da cidade por entre as ruas cheias de gente.
Ergo uma parede de painéis publicitários por cima dos prédios, subo essa mesma parede para espreitar o vazio do outro lado e faço com os restos das vozes, a linguagem urbana, em que o silêncio funciona como todas as conversas.
Encosto-me ao corrimão da escada que me toca... e é isto, é tão somente isto que fica da arquitectura imprecisa das ruas, onde espreito os pisos térreos para saber até onde vão os corredores que me atraem.
É isto a cidade.
Dia e noite ela despe-se para quem a olha,
e ergue-se mais à frente, dando a ilusão da diferença para que entremos nela
como se nunca a tivéssemos conhecido.
segunda-feira, 6 de agosto de 2007
Words
Ponho as palavras em cima da mesa e deixo que se sirvam delas.
em todas as conversas elas sobram
mas há as que que ficam sobre a mesa quando nos vamos embora de um qualquer sítio.
ficam frias com a noite
mas no dia seguinte a manhã varre-as.
por isso, quando saio,
verifico se ficaram algumas delas sobre a mesa,
meto-as no bolso
e guardo-as na gaveta do poema.
algum dia,
estas palavras hão-de servir para alguma coisa.
em todas as conversas elas sobram
mas há as que que ficam sobre a mesa quando nos vamos embora de um qualquer sítio.
ficam frias com a noite
mas no dia seguinte a manhã varre-as.
por isso, quando saio,
verifico se ficaram algumas delas sobre a mesa,
meto-as no bolso
e guardo-as na gaveta do poema.
algum dia,
estas palavras hão-de servir para alguma coisa.
O que fica?
Inércia
hoje...hoje seria, é, talvez, um dia de conversa fora de horas... hoje não me apetece nada. passam-se alguns dias assim, a tentar arranjar algo para se fazer, para nos entreter no "tempo do relógio", para que o tempo mental não tome conta de nós. lá fora os sons lembra-nos que há vida, vidas de um lado para o outro, que nada pára, nem mesmo a mente dos mais serenos. e eu aqui, em frente a um ecran a tentar descrever por palavras o que não escrevo mentalmente, ou literalmente, em mim.
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