Significantes

Pego num pedaço de silêncio.
Parto-o ao meio e vejo saírem de dentro dele as palavras que ficaram por dizer.
Umas, meto-as num frasco;
outras, guardo-as na memória para as dizer, um dia,
a quem me perguntar o que significam.

Envolcro

Há uma mão que afaga
para lhe emprestar fervor,
moldando-lhe o sombreado dos contornes.
Há uma voz que ressoa
no silêncio do corpo,
para o restituir à existência
e devolver-lhe textura.

Retina insone

Na manhã submersa pelo sono
tudo desperta lenta e vagarosamente
percorrendo o silêncio de momentos...
há neles a nostalgia, a magia da fábula,
o mistério, o ser e não ter tempo.
Corremos nus no pensamento,
livres do exílio desse ritual de implicações e complicações
que se inicia ao acordar,
cúmplices da dúvida que (co)habita
e cujo descanso só chega após horas de insónia,
quando a retina se fecha.

(Des)encontros

...porque os dias passam rente
às esquinas de quem passa,
porque os dias falam rente
às esquinas de quem se ouve,
porque os dias voam rente
às esquinas de quem raramente se cruza.

Why not?

...porque não sentir quem nos toca?
inalando depois quem nos foge.

Linguagem

A única geografia que me conhece
são as palavras,
e como a chuva
que repousa entre o ar e a terra
escrevo-me,
na ausência de todas as línguas.